segunda-feira, 5 de março de 2012

Que transbordem coisas boas, e as ruins sejam sufocadas. Baú, menina, é um lugar sombrio. Lembre-se, o que é bom tem que estar num lugar bonito.

                                                   


Eu ando meio distante, sabe. Não sabe, ninguém sabe de nada. Às vezes acham que sabem, mas é só isso.
Estou meio distante de coisas e pensamentos que antes eram só meus, e agora são do meu, do meu passado. Tô deixando coisas. (Coisaqualquer objeto inanimado; em sentido filosófico, coisa é tudo aquilo subsistente por si mesmo; a filosofia kantiana afirma ser uma coisa aquilo que existe independentemente do espírito; no sentido usual, como para o Direito, coisa é tudo aquilo que, percebido pelos sentidos, pode apresentar utilidade para o homem, caso em que se chama bem material ou espiritual.)

Tá lá, entende? Tá lá mas não ta aqui. Era só meu, e agora eu divido uns noventa por cento. Os dez por cento que me sobram é só pra lembrar que existiram e poder lembrar que foi meu, e ainda é um pouquinho.

Deve ser normal se desprender de gostos. Se não for, pode mandar prender, me condeno.

Escrevendo linhas sem sentido como estas que agora escrevi, me pego lendo e relendo frases, e apagando, escrevendo e fazendo todo o ciclo novamente. Penso, quantas palavras foram apagadas e substituídas em menos de dois minutos, com um breve e medíocre julgamento de quem achou que não estava bom? E nem tinha que ser, e nem é. Se é espontâneo, oras.  E qual critério foi utilizado? O meu, é claro. E olha que nem critério eu tenho.

Acho que a vida é assim também. Sem critérios.
Alías até tem, mas a gente acaba esquecendo. Ou fingindo que.

A vida é um amontoado de coisas. Assim que eu vejo.
Das boas, ruins, e das mais ou menos que, em alguns casos, ocupam o fundo do baú e que eu já coloquei numa posição mais e menos. Tirei o ou. 
Estranho, mas são as ruins que transbordam. As coisas boas a gente nem sempre lembra, até porque às vezes deixamos passar despercebidos os acontecimentos bons. Distração. Ou por achar que coisa boa está distante, mas tá perto. Tá num sorriso, tá num olhar, tá.
Mas a gente amontoa mesmo. Pensamentos, gostos, musicas, livros, histórias, palavras. E não tem critério maior do que o nosso. Porque na verdade, nós vamos fazendo tudo do nosso jeito. Não importa qual. E quem se importa sofre. Porque o mundo vai  julgar, não importa o que você faça, o que você pense. Enquanto uns acham lindo, outros vão achar a coisa mais idiota e inaceitável.

Estou fazendo o meu montinho também. Mas deixando transbordar as coisas boas, estou tentando não deixar passar nada, nadinha. No meu baú só fica dentro aquilo que não me serve mais, que não preenche, que não faz diferença. As mais ou menos eu nem tenho mais, não quero mais meios termos. Ou é bom, ou é ruim.
E as boas eu vou deixar pertinho de mim, bem pertinho. E não tem lugar melhor para guardá-las do que num lugar onde o pulsar é constante,  que nem o tempo pode levar, e só vão poder tirar de mim se me tirarem a vida também: Nele, nele mesmo, no coração.



Françoíse A. Machado.



Escrito ao som de One, U2.

2 comentários:

  1. Guardo as coisas boas no coração também, assim nada as roubará de mim.
    Andou sumida, vê se não foge mais daqui.

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  2. Muito bom poder ler um texto seu novamente! E espero que volte a postar com frequência, porque seus escritos são excelentes!
    Faz parte da evolução nos desprendermos de certos gostos e coisas, acho que é a partir disso que vamos definindo nossas certezas, nossas dúvidas e, obviamente, nossa personalidade. E o que é bom, a gente guarda bem guardado do lado esquerdo do peito, porque é ali que tudo de melhor deve ficar...

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